sexta-feira, 20 de maio de 2011

Geopark Adventure Trip - Etapa 3

Etapa 3: Proença-a-Nova - Oleiros

“Last but not the least!” - Eis que chegámos ao último dia, à derradeira etapa desta Geopark Adventure Trip. Poderá parecer incomum ou mesmo caricato dizer isto mas esta terceira etapa foi a melhor de todas as que compuseram esta aventura, e isto pode ser dito a todos os níveis que possam imaginar!

Da qualidade dos trilhos à beleza paisagística, da exigência física à obstinação, por todos estes e mais alguns motivos, este 3º dia ficará para todos nós, no nosso “baú de recordações”, como um dia inesquecível passado em cima de uma Bicicleta Todo o Terreno! Não faço disto um cliché, mas sim uma verdade absoluta, pelo menos para mim/nós como bttistas lúdicos, tal como nos prezamos ser.

A qualidade dos trilhos nesta terceira etapa só não é brilhante porque tal como na segunda etapa surgem troços com inclinações e/ou instabilidade do sedimento que tornam a progressão no terreno quase impossível, mesmo na vertente “passeio pedestre com a ginga às costas”, quando mesmo ao lado existem melhores alternativas, perfeitamente cicláveis e nalguns casos bem mais emolduradas com a paisagem circundante. Um pormenor que requer sem dúvida atenção em futuras reedições.

Os trilhos na sua generalidade são bons, com piso predominantemente xistoso, pouco solto, sempre bem enquadrados em zonas de floresta de pinho e eucalipto e nas cotas mais altas com muito mato rasteiro. Quanto à paisagem, meus amigos, só quem lá vai pode atestar da sua magnificência! Da paisagem de altura que se obtém no Parque Eólico do Vergão e no Cabeço da Rainha, às emblemáticas passagens pela Praia Fluvial do Malhadal e Aldeia Ruiva, pontes e passagens sobre a Ribeira de Isna, toda a subida junto às diversas Aldeias do Xisto – Corgas, Pedintal, encravadas nas montanhas com a ribeira límpida a correr aos nossos pés… bem só tenho que dizer que este Portugal profundo merece uma visita! Lindo, lindo, lindo!

O dia foi igualmente magnânimo devido à exigência física requerida e claro à obstinação que nos tomou “de assalto” para completarmos com sucesso toda esta aventura a que nos propusemos. Chegámos a este terceiro dia com mais de 200 km’s e 4000 metros de acumulado de subidas nas pernas percorridos em 2 dias… é claro, que o cansaço começa a tomar conta de músculos e articulações, uma vez que o tempo de recuperação não era muito!

“A verdadeira força está no nosso cérebro e não nas nossas pernas”, ou seja, para levar de vencida determinadas “labutas”, temos que acima de tudo trabalhar com a psicologia e um bocadinho menos com o físico! E aqui entram sem dúvida a obstinação e a motivação como elementos chave para levar a jornada ao sucesso! A obstinação estava, no nosso caso, no auge! Tínhamos um conjunto de objectivos e pretendíamos levá-los todos até ao fim! Desfrutar, apreciar, fotografar e confraternizar eram os objectivos primordiais e esses desde o primeiro minuto estavam na linha da frente. Terminar estas 3 etapas, sem inicidentes eram os restantes. Conseguimos!

Não posso deixar de me referir à motivação que nos envolveu - mais uma vez o psicológico a dominar. Podíamos não estar bem preparados fisicamente, mas motivados, isso, ninguém consegue negar que estávamos. E essa motivação veio dos mais diversos e inexpiáveis quadrantes, às vezes sabe-se lá de onde!… Foram sobretudo os amigos, os familiares e a nossa própria interacção e camaradagem, as verdadeiras pedras basilares dessa motivação! Resultaram!

Deixamos a conversa “fiada” e vamos a pormenores! Mais uma vez o dia começou cedo, de “madrugada” como diria o CLI, numa altura que o “esqueleto” se colava ao colchão que nem uma lapa. “Será que dá para ligar a dizer que hoje não vou?” “Vou meter atestado!” “Morreu o periquito!”… Bem, tudo isto se cruzou na mente enquanto me decidia a levantar. Estava decididamente na “Idade do Condor” - Com dor aqui, com dor ali, com dor por todo o lado! Raios! Mas… mal colocado o primeiro pé no sapato de encaixe a coisa deu uma volta de 180 graus! Novas energias, nova motivação! “Bamos lá carago… até os comemos!”

Às 7:30 h estava à porta do João Valente, pronto para carregar a ginga e o camel-bag, hoje ainda mais pesado e atestado até ao cimo, pois a etapa prometia dureza acrescida! À espera estava já o Pedro Antunes, e pouco depois chegou o João Valente, o pai dele, nosso motorista e para não deixar de cumprir a tradição, por fim o Agnelo, “atrasado” como sempre! Ehehehe… A viagem, um pouco mais longa terminou em Proença-a-Nova onde cafeínizamos a alma e preparamos o corpinho para mais esta “estopada”. Depois da foto da praxe, lá saímos para os trilhos em direcção a Oleiros já bem perto das 9 horas.

O track original prometia, no dia de hoje, um constante sobe e desce com cerca de 9 subidas mais exigentes e como não podia deixar de ser, começou desde logo assim - uma subidinha de 3km’s que nos levaria aos arredores de Proença até aos 600 m de altitude, dando logo ali uma antevisão do que seria uma constante ao longo do dia - paisagens de altitude inesquecíveis! Contornada a aldeia de Labrunhal Cimeiro iniciamos novas subidas e descidas que nos levaram até perto de Vales onde começava uma das mais bonitas e exigentes subidas do dia até ao Parque Eólico do Vergão, as primeiras eólicas do dia. Repetindo a “receita”, passo certinho leva-nos longe, fomos vencendo a “parede” que terminou com um “pequeno passeio pedestre” mesmo antes da torre de vigia. Mas a paisagem valeu bem a pena - magnífica!

Íamos com cerca de 15km’s , era já tempo de vitaminar o corpinho, embora o vento forte quase nos arrastasse pela serra abaixo… mais valia desligarem estas “ventoinhas” pois estavam a fazer muita brisa! Mesmo ali ao lado estava um geo-caixotinho, que depressa cachamos para as nossas contas pessoais e seguimos viagem ao longo do parque eólico, com as aldeias das Cimadas do nosso lado direito e do lado esquerdo as aldeias do Vergão, Rafael, Maljoga e Isna S. Carlos a dormitar lá bem em baixo. Lá longe, o Cabeço da Rainha brilhava ao sol da manhã, a desafiar-nos…

Seguia-se agora uma apreciada descida quase paralela ao IC8 que nos levaria à Aldeia Ruiva e depois da ribeira, à Isna de S. Carlos onde atestamos os cantis de água e iniciámos mais uma imponente subida que nos levaria ao alto da serra sobre a aldeia de Sipote, onde se seguiu um novo misto de sobes e desces a meia encosta, culminando numa alucinante descida para a Praia Fluvial do Malhadal… uma daquelas descidas em que as pastilhas ficam a cheirar a ferodo queimado… que doideira!

A chegada ao Malhadal mostra-nos o que de mais bonito esta região tem para oferecer – uma paisagem de ribeira, em que o xisto domina, emoldurada com uma antiga ponte sobre o curso de água, com o percurso a saltitar de margem para margem aproveitando os singles criados pelas gentes locais, inúmeras pontes, algumas rudimentares e socalcos de acesso a hortas e terrenos de floresta… só vendo se pode apreciar toda esta beleza natural suspensa no tempo!...

A viagem continuava e agora esperava-nos outra subida, desta vez até ao alto das Corgas, onde chegámos já bem perto da hora de almoço. Ora como um homem não é de ferro, quanto mais 4, decidimos descer até ao centro da aldeia, onde refrescamos o corpinho no café central e onde confraternizámos mais uma vez com a malta habitante… a tal ponto que a dado passo já estávamos enfiados na adega do Ti Américo, com a jeropiga nos copos e uma “exigência” quase conquistada de comermos um prato de canja e pão com queijo à descrição!... O pessoal destas bandas são mesmo “portugas de gema” - hospitaleiros q.b.! Ficamo-nos pela jeropiga e saímos dali em “passo de corrida” senão ainda lá estaríamos!

Novamente em subida, seguimos em direcção às proximidades da Barragem das Corgas e mais adiante outra bonita aldeia perdida - Pedintal, onde nos fartámos de “pedir” ao pedal para lá chegar… nestas bandas não há trilhos a direito… ou sobes…ou desces… “Up and Down” era o tema do dia!... Contornámos esta aldeia pela esquerda, onde molhámos os “pezinhos” na ribeira “gelada” (que bem soube!) e seguimos por um trilho paralelo até cruzarmos mais uma ponte de xisto perdida no vale… soberbo!

A “senhora” que se seguiu, ao km 43, foi a aldeia da Ribeira de Isna onde o espírito “pedinchão” do João Valente fez novamente das suas e lá cravou umas laranjas a um habitante local, laranjas essas que souberam a “ouro”, enquanto íamos quase tomando banho noutra torneira pública, pois o calor apertava! Esta mania de tomar banho por aí, numa torneira qualquer, ainda pega moda!

O Cabeço da Rainha estava bem na nossa frente e sabíamos que tínhamos de lá ir acima, a quase 1100 m de altitude, mas o raio da subida não havia maneira de começar!... Ora subindo ligeiramente, ora com descidas “maricas” íamos “lambendo” a serra, mas nada de subida, a tal ponto que já havia pessoal a dizer frases inimagináveis num dia destes: “ Mais descidas não!...” Só podia ser do calor! Eehehehehe…

Mas ela lá começou, imponente, sobretudo numa daquelas partes “inexplicáveis” em que tínhamos pela frente uma parede que até a pé custava a subir, com caminhos cicláveis mesmo ali ao lado… não havia “nexexidade”! Mas a subida continuava e lá seguimos serra acima até ao parque eólico, lá mesmo no topo, onde a paisagem premeia quem se atreve a subir… duro mas fantástico em simultâneo! O cansaço começava a notar-se no grupo e houve quem, no cimo do Cabeço, visivelmente fatigado, afirmasse “a pés juntos” - “Eu já não subo mais serra nenhumaaaa!!!!” Pois sim… não querias mais nada… faltavam 3 e… subiu-as todas! Ahahahahah…

Na vertente norte da serra, seguimos o track, já com Oleiros em pano de fundo, mas ainda com um constante sobe e desce junto às aldeias de Fernão Porco, Sardeiras de Baixo e de Cima, sempre com as torres eólicas a dominar a paisagem. O fim aproximava-se… mas para tal faltava uma última subida quase novamente até aos 900 m, na base das eólicas, que terminava junto à manancial fonte de água na EN 538. A promessa de água fresca e o fim das subidas fez milagres e a malta, em bom andamento levou de vencida estes últimos metros ascendentes, bebendo depois com prazer aquela água fresca, cristalina… um prémio singular!

Com a tarde no seu auge, entrávamos em Oleiros por uma imensa floresta de pinho e fetos, que à média luz compunham uma paisagem inesquecível, a lembrar a Lousã nalguns dos seus troços mais bonitos…. É mesmo um prazer pedalar aqui! Íamos cansados é certo, mas visivelmente satisfeitos pelo dia bem passado a fazermos aquilo que gostamos - pedalar em BTT por ricas e singulares paisagens, em boa amizade e com bons momentos… inesquecíveis!

À nossa espera, o nosso “motorista” aguardava-nos com água fresquinha e claro… um saco de laranjas - querem ver o João Valente feliz, é dar-lhe laranjas! Em resumo… foram 3 dias intensos fisicamente, mas extraordinários a nível psicológico, pois mais uma vez senti que a camaradagem e o espírito de entreajuda fazem toda a diferença! Sim é possível fazer grandes míticas assim haja força de espírito, obstinação e motivação para tal. O treino é importante, a alimentação também, não podendo ser descurados… mas se não houver motivação e o tal gosto pelo pedal… tudo se torna mais difícil!!

Termino esta já longa crónica com os agradecimentos habituais, os quais aqui publico por ordem puramente aleatória:

- Ao João Valente por mais uma vez me ter desafiado para uma grande maluqueira;
- Aos companheiros Agnelo Quelhas e Pedro Antunes por terem aceite acompanhar-nos nesta aventura;
- Ao Fidalgo e ao pai do João Valente por nos terem ajudado em toda esta logística, que de outra maneira teria sido bem mais difícil de concluir com êxito;
- Ao Geopark Naturtejo, na pessoa do Eng. Armindo pelo contributo para esta aventura;
- Ao amigo AC que nos forneceu os tracks GPS, permitindo reeditar em autonomia, toda essa mítica prova que foi o Trip Trail 2010;
- Aos nossos familiares que nos aturaram a “maluqueira”, que nos fizeram ovos mexidos, que nos compraram isotónicos, que nos perguntavam pelo dia, que nos incentivaram a concluirmos estas 3 etapas;
- Ao Paulo Alves, representante dessas grandes máquinas Canyon, pelo cedência para test-drive da bicicleta Canyon Lux MR 9.0 SL Lux, 142 alucinantes Km’s de experiência;
- Ao Sr. Eduardo da Ferraria, ao Sr. Américo das Corgas, ao Sr. Anónimo da Ribeira de Isna, que de uma forma desinteressada nos proporcionaram momentos de convívio inesperados mas extremamente “saborosos” e bastante “hidratados”!
- A todos os nossos conhecidos, amigos e amigas, alguns dos quais sem saberem ou sem esperarem, nos incentivaram, e de que maneira, a desafiarmos os nossos próprios horizontes, levando mais além todo este nosso gosto pelo pedal;
- A todos vós - o nosso (muito) obrigado!

Reportagem: Fernando Micaelo
Fotografia: João Valente e Agnelo Quelhas



quinta-feira, 19 de maio de 2011

Geopark Adventure Trip - Etapa 2

Etapa 2: Vila Velha de Rodão - Proença-a-Nova

O dia finda depressa e a noite é demasiado curta para a recuperação necessária! Ainda existem um sem número de “coisas” para arrumar, repor, fazer ou mesmo manter!!! É nesta transição de etapas que também a organização individual deve estar bem oleada afim de podermos ter o máximo de tempo possível para a devida recuperação!

A noite fugaz passa em acelerado e o dia 14 de Maio rompe cheio de sol! Mais um dia quente… muito quente para uma etapa que não prometia facilidades! À semelhança do dia anterior o nosso terceiro elemento Agnelo Quelhas declinou em cima de hora a possibilidade de marcar presença na 2ª Etapa do Geopark Adventure Trip! O companheiro de muitas aventuras, Fernando Micaelo… esse não faltaria decerto! A ambição de atingirmos o objectivo era demasiado forte… apenas algo explicitamente incontornável nos poderia demover!

Rumámos a Vila Velha de Rodão, para partirmos cerca das 8:30 em direcção a Proença-a-Nova, o destino desta segunda etapa por terras do Geopark Naturtejo! As pernas no início sentem-se pesadas, trôpegas e parecem não responder ao estímulo da cadência… mas com o devido aquecimento tudo volta ao lugar e depressa se “engrena” a pedalada!

Com passagem no centro da vila e depois nas laterais da laboradora e fumegante Celtejo, cedo aquecemos (!!!), ao cortar para o Caminho Florestal da Serra da Achada, onde a pendente ascendente inicia e não mais pára durante largos Km’s! Para além de bastante inclinado o caminho é bem técnico, pejado de pedra xistosa! Eu diria… um “bom” começo!!!

Em plena Serra de Vila Velha, passámos em alguns troços comuns ao Percurso Pedestre de PR - Rota das Invasões, ladeámos o Cabeço do Penedo Gordo e avistámos lá bem ao longe e a nível linear o Castelo do Rei Wamba… estávamos a pedalar em boa altitude… e isso sentia-se no nosso “arfar” por ali acima!!!

Já com alguns Km’s nas pernas começámos a avistar à nossa esquerda o tabuleiro da A23, que dá ligação ao nó do Perdigão… era para ali que nos dirigíamos! Até lá… a pendente inverte-se instantaneamente! É “dar ferro” no travão e “rezar” para não voar por cima do guiador! Desce-se por trilhos bastante técnicos e acidentados a exigir muita concentração e perícia!

Na pacata aldeia do Perdigão circulámos pelo meio da localidade, metendo mesmo conversa com uma simpática senhora de couveira e regador na mão! Gente de fora que vem buscar paz e serenidade a estes recantos tranquilos da nossa Beira! A conversa foi breve… e breve foi também a nossa tranquilidade! A Serra do Perdigão assolava-se à nossa frente… tal qual Adamastor aos Portugueses! Imponente e inclinada, com alguns troços praticamente impossíveis de transpor em bicicleta, obrigando a puxar por elas umas boas dezenas de metros!!!

Subimos até 2/3 da cota máxima e por ali circulámos ao longo da serra por alguns Km’s, onde o piso era bastante ciclável e a paisagem à nossa esquerda avassalaora! Sentia-se o cheiro intenso a pinhal… o ar puro da altura, e o calor iria começar a sentir-se cada vez mais! A paisagem é longínqua e o relevo faz-nos lembrar que estamos em plena zona do Pinhal Interior!

Deste estradão a meia vertente da Serra do Perdigão desce-se abruptamente para a Ladeira, cruzando a estrada municipal, seguindo em pendente descendente até às margens do Rio Ocreza… lá bem abaixo! Abre-se diante dos nossos olhos umas das mais magníficas paisagens desta aventura! Rio e serra diante de nós! Muito Bonito!

Com a chegada ao rio, entrámos na parte mais relaxante da 2ª Etapa… uma zona onde acompanhámos por vários Km’s a margem esquerda do Rio Ocreza. Face ao número significativo de caminhos existentes e as vários possibilidades de escolha, notámos que a sinalética alusiva à prova oficial Trip Trail estava muito presente nesta zona (mesmo passado quase um ano)… não tendo sido retirada após a prova! Uma nota negativa para a organização Horizontes.

Face ao cenário idílico da calmia do rio em conjugação com a natureza, efectuámos uma pequena pausa para abastecimento, seguindo depois, rumo à Foz do Cobrão, uma das aldeias que compõe a Rede das Aldeias de Xisto, local digno de visita turística! Esta é sempre uma zona de beleza invulgar e apesar de a conhecermos “de gingeira” o apelo ao “click fotográfico” é uma constante!

Da Foz do Cobrão segue-se para Sobral Fernando e as dificuldades reiniciam, com a subida progressiva por todo o Vale Almourão até aos Carregais (onde não se chega a entrar), circulando pelo PR2 de Proença-a-Nova.

De salientar a importância dos geomonumentos desta zona, com relevo para a garganta do rio Ocreza (Portas do Almourão ou Vale Almourão). Aqui a paisagem continua selvagem, magnificada pelas escarpas quartzíticas, pelas imponentes dobras tectónicas e pelo profundo rasgão que é o Vale do Ocreza. A diversificada da paisagem geológica suporta ecossistemas muito bem preservados, sendo uma importante área de nidificação de aves de rapina. Sem dúvida…um ex-libiris do Geoparque Naturtejo da Meseta Meridional.

O dia ia avançando paulatianemente… e a temperatura parecia cada vez mais alta! Calor em excesso é algo com que não lido muito bem!!! Este iria fazer-se sentir em demasia na longa e exigente subida das proximidades do Casal da Ribeira para a Ferraria! Inclinações doidas, piso tipo areão, sombras zero! Sentia… e via o suor pingar sobre o guiador! Um suplício!... Para mim o momento mais agressivo destes 3 dias! À entrada da Ferraria, a minha prioridade era parar e baixar a temperatura corporal o mais rapidamente possível! Assim foi!

O Srº Eduardo, vigilante do Posto de Vigia Picoto Rainho recebeu-nos como conhecidos de à muitos anos! A torneira que se avista do caminho fez-me para de imediato e fazer ladrar o canino que ali protege as imediações! O Srº Eduardo acode… e a relação estabelece-se!!! Torneia à disposição, sombra e laranjas frescas! Foram cerca de 30 minutos… que para mim valeram ouro!! É destes momentos que nos iremos recordar por muito e muito tempo!!! Certamente o Fernando partilha da mesma opinião! Formidável! Mas… a saga tinha de continuar!

Da Ferraria para a Catraia Cimeira e depois Montes da Senhora foram localidades em que passámos! Tínhamos percorrido cerca de 50 exigentes Km’s e a hora do almoço culminara com uma passagem numa ribeirita de águas cristalinas (provavelmente a Ribeira do Alvito), cheia de frondosos fetos… um local bem apetecível ao piquenique e à banhoca!! Bem dito, bem feito!

O calor nos píncaros fizera-nos esquecer por momentos os cerca de 15Km’s que ainda tínhamos a percorrrer… e vai de mergulho nas águas frescas da ribeira! Ufffff…. uma sensação fresca, revitalizadora e energética para o culminar dos Km’s!!! Associado a isso, umas sandochas para abastecer o corpinho! Estávamos prontos para o que viesse


Sempre, ora a subir ora a descer… nunca a direito (!!!), seguimos pelos Sesmos, ladeámos o Pereiro e visitámos mais uma Aldeia do Xisto - Figueira, onde o aspecto revitalizado de algumas ruelas fazem o eco-turismo proliferar! Entrámos na Loja das Aldeias do xisto para uma bebida fresquinha, prosseguindo depois em “up-hill” para o Vale de Urso!

De referir que apesar da etapa 2 ser bastante curta (cerca de 66Km’s) comparativamente com o dia anterior… é bem mais musculada em termos altimétricos! Era de vital importância efectuarmos uma criteriosa gestão de esforço para que no dia seguinte houvesse reserva (suficiente) para a etapa 3… ainda mais exigente!

Proença-a-Nova esperava-nos na sua calmia de meia tarde… onde no jardim terminámos a ligação desde Vila Velha de Rodão. Aperto sentido de mãos suadas, cansadas… mas fortes! Eu (João Valente) e o meu comparsa Fernando Micaelo tínhamos cumprido os 66Km’s - 1948 metros acumulados de subida em cerca de 5:50h a pedalar. Tínhamos o ego em alta!

2 Etapas do Geopark Adventure Trip estavam completas sem incidentes de maior! Fisicamente podíamos estar algo desgastados… mas psicologicamente muito fortes! Como seria o dia 3? Estaríamos à altura? Uma terceira (exigente) etapa era algo de novo para nós, algo que nunca tínhamos experimentado! A expectativa estava em alta… mas agora era tempo de recolher novamente à cidade de Castelo Branco… e recuperar para a Etapa Final do Geopark Adventure Trip, a ligação entre Proença-a-Nova e Oleiros.

Reportagem: João Valente
Fotografia: João Valente


quarta-feira, 18 de maio de 2011

Geopark Adventure Trip - Etapa 1

Etapa 1: Termas de Monfortinho - Vila Velha de Rodão

Há quem diga que é difícil equilibrar-se em cima de uma bicicleta... outros que é difícil pedalar serra acima... Ora cá está o momento da verdade! Eu acho que difícil mesmo é descrever, transmitir, emoldurar aqui aquilo que vivemos, sentimos e confraternizamos ao longo de três memoráveis dias já guardados no nosso "baú de recordações" desta "viagem aventureira" pelos trilhos do Geopark Naturtejo! Vamos ver o que vai daqui sair!...

Tal como aqui fomos publicando, esta ideia "maluca" de percorrer os trilhos do Trip Trail Geopark Naturtejo-2010 surgiu logo que a prova veio para os cabeçalhos das notícias do mundo cicloturístico… aqui estava uma aventura engraçada para juntarmos aos nossos portfolios de bttistas lúdicos, mais uma daquelas que se guardam nos álbuns para mais tarde recordar!

A ideia de efectuar uma “viagem pelos sentidos” ao longo de 3 intensos dias, por 270 km’s do Geopark Naturtejo e 6 concelhos da nossa bonita Beira Interior cativou-nos desde logo. Não fosse o “preço alto” das inscrições e também teríamos participado na ocasião. Mas nem tudo estava perdido. Com calma, algum planeamento e ajuda de amigos e familiares tudo se consegue fazer, até isto. Não se faz inseridos na prova… faz-se em autonomia, ao melhor estilo Geo Raid… a que estamos habituados!! Eheheh…

Contudo nem tudo são facilidades! A realização de uma aventura destas implica sempre alguma logística, que atempadamente planeamos e pusemos em prática e igualmente requeria alguma preparação física e psicológica, talvez o nosso elo mais fraco, pois os últimos tempos tinham sido de estudo e muito trabalho, estando as bikes um pouco arredadas do nosso habitual convívio. Mas “Deus quer, o homem sonha e a obra nasce”! Portanto equaciona-se, planeia-se e realiza-se! Não havia volta a dar! E os dias 13, 14 e 15 de Maio chegaram depressa, assim como o nosso desejo de mais uma épica aventura!

O dia 13 de Maio marcava o início desta jornada que prometia percursos de rara beleza, aldeias histórias, monumentos naturais, castelos, fortalezas… etc, etc. Igualmente prometia dureza, espírito de sacrifício, motivação aditada… constantes habituais neste tipo de ultramaratonas, elementos que tínhamos bem na consciência quando o dia começou, bem cedo, pelas 6 e picos, com os preparos habituais para uma grande aventura em BTT - sandochas de todos os tipos e feitios, água e isotónicas q.b., material de oficina, etc, etc… Camel-bag cheio… até ao cimo!! Ficou pesado, mas era necessário! Quando avançamos para jornadas deste calibre em autonomia temos de ser auto-suficientes em tudo! Pelas 7 horas fui “apanhado” pelo Fidalgo, a nossa boleia para o primeiro dia seguindo-se depois o João Valente, junto do qual fiquei a saber que estávamos reduzidos à equipa habitual para estas doidices! O Agnelo à ultima da hora ficou “preso” na cidade com compromissos profissionais.

Chegados às Termas de Monfortinho, e depois de uma cafézada e de uma foto de grupo era tempo de darmos início a esta mítica aventura! Sem dúvida uma das maiores em que nos aventurámos… e que pretendíamos realizar ate ao fim! Pelas 08:30 saímos das Termas de Monfortinho em direcção a Vila Velha de Rodão, ao longo de 140 longos Km’s pelo Geopark Naturtejo, a primeira etapa da Geopark Adventure Trip, eu com a minha Trek Elite 9.8 e o João Valente, hoje com a Canyon Lux MR 9.0 SL, em mais um teste a uma grande máquina a pedal.

Saímos das Termas, em direcção às margens do Erges, fronteira natural entre Portugal e Espanha, e que marca os primeiros quilómetros pela sua beleza e acalmia aquela hora da manhã. Igualmente a nossa postura era silenciosa, anormalmente calma… íamos ambos a pensar no que nos esperava ao longo destes dias… seriamos capazes?? Estava um silêncio quase ruidoso, facilmente entendido entre ambos!

Nestas viagens tem que se dar a importância devida às coisas que nos rodeiam, mas sem stressar em demasia. Estávamos lá para desfrutar e foi isso mesmo que começamos a fazer depois desses momentos iniciais de introspecção! Para a frente é que é o caminho e foi isso mesmo que fizemos - pedalar com gosto, descontracção, contemplação e em boa camaradagem! E a língua depressa se soltou!

Os caminhos iniciais espraiam-se ao longo da Raia, paralelos à Serra de Penha Garcia de um lado e o Erges do outro, em zona de mato rasteiro, oliveiras, azinheiras e alguns eucaliptos que começam a fazer parte da paisagem local. O trilho é tipicamente quartzitíco com algumas zonas exigentes devido à pedra roliça. Bem perto avistamos as piscinas do Clube de Caça e Pesca onde esperamos regressar em Junho pela mão do Fidalgo, passando pouco depois pela pacata aldeia da Torre de Monfortinho, ainda adormecida aquela hora da manhã… nem vivalma!

Logo depois deparamo-nos com uma daquelas situações que suscita pontos de interrogação no cérebro… e agora? Tínhamos uma cerca para abrir e uma vintena de vacas curiosas do outro lado… passamos, não passamos… bem lá passamos, com as vacas meias tresmalhadas bem à nossa frente a correr que nem doidas! Ainda bem que correram elas e não nós à frente delas!

Sempre por bons estradões, fomos pedalando quase paralelos à EN-239, avistando-se Penha Garcia do lado de lá, na base da serra, um local muito bonito onde, com muita pena nossa, o track “oficial” não passa, pois seria interessante rever a zona dos fosséis a jusante da barragem. Fica para uma próxima!

Monsanto altaneiro ia-se avistando cada vez mais próximo, e representava a primeira dificuldade do dia, pois ao km 35 tínhamos a sua subida, desta vez pela calçada romana do lado da Devesa, uma “nossa velha conhecida” que já fiz inclusive com a SS e que seria subida pela primeira vez pela minha Trek. Como manda o figurino, pedalada forte e certinha leva-nos longe e assim se fez em boa cadência até lá acima, atingindo o topo da aldeia mais portuguesa de Portugal, onde a paisagem encanta sempre e a digital não se farta de fotografar!

Novamente pela calçada romana, agora do lado do S. Pedro de Vir-a-Corça, descemos este granítico “caroço”, desfrutando ainda de um single pejado de ortigas que nos levaria até à capela deste santo de nome invulgar, um local em que se respira história medieval! Ainda me lembro da última feira medieval que aqui assisti. Muito boa!

Depois do Carroqueiro os trilhos mudam um pouco surgindo agora alguma terra arenosa e barrenta, aprimorada por uma excelente e adrenalínica descida que nos leva pelo km 50 a Idanha-a-Velha, outro local onde se respira história e cultura ancestral. Aproveitamos para lá dar uma voltinha, entrando novamente no track junto à antiquíssima ponte que cruza o Pônsul e que nos leva por uma boa e constante subida, igualmente quase paralela à EN-332 até à terra dos aviadores portugueses, já com o km 6o no GPS - Alcafozes!

Vitaminado o corpinho à sombra da aeronave especada à entrada do santuário da Nossa Senhora do Loreto, padroeira da Aviação, era tempo de regressar aos trilhos marcados do GR12, por onde entramos noutro santuário, este muito querido pela minha família e onde estivemos em confraternização no dia 8, há menos de uma semana - a Nossa Senhora do Almortão.

Por asfalto seguimos até à base do “caroço” de Idanha-a-Nova e noutro local de culto dedicado à Nossa Senhora da Graça, começámos mais uma das complicadas subidas deste primeiro dia, ainda mais porque o calor apertava - a subida da calçada romana até ao centro histórico da vila. Aplicando a mesma receita de Monsanto, sempre com uma criteriosa gestão do esforço, lá levamos mais esta de vencida, entrando pouco depois na zona central da vila, junto à Câmara Municipal e onde supostamente teríamos um encontro com o Eng. Armindo, que não se veio a concretizar devido a questões de agenda.

Bem mas mesmo ali ao lado estava um café-restaurante com uma esplanada de laranjeiras com óptimo e refrescante aspecto… E se fossemos ali beber uma fresquinha?... Não só bebemos, como também degustamos um excelente bitoque de vaca XL que nos soube soberbamente!!! O calor apertava, mas ali à sombra das laranjeiras almoçamos principescamente, sempre com a bebida fresca a acalmar as gargantas secas e irritadas do pó e do calor… um momento “kit-kat” não planeado mas que saiu às mil maravilhas!


Estávamos no meio da primeira etapa (km 70) e a meio do dia, com o Sol no zénite, bem em cima de nós! Saímos agora de Idanha-a-Nova em direcção ao Ladoeiro, tendo por passagem intermédia a Herdade do Couto da Várzea, mas como o calor apertava o João decidiu parar à sombra… Um furo! Pois é, isto de “sair à rua” sem tubeless e “vestido” com câmaras-de-ar de “papel” tem destas contrariedades! Substituída a câmara de ar, lá nos lançamos numa boa descida que nos leva ao Couto da Várzea, local em que entramos na zona de planície que caracteriza a campina de Idanha.

Mas ainda antes de chegarmos ao Ladoeiro, um novo furo fez das suas, pois obrigou-nos a recorrer a uma nova câmara, desta vez com “nhenha” para ver se chegava ao fim do percurso, acabando ali o nosso stock… não podíamos ter mais furos! Entre searas de milho e algumas quintas de gado, passamos por dentro do Ladoeiro, entrando pouco depois na EN que leva a Monforte e onde cruzamos para o estradão que nos leva ao Monte Grande.

Nesse belo estradão, ladeado de muitos sobreiros e azinheiras, tivemos uma bela surpresa, pois quando demos conta tínhamos uma portentosa porca preta e os seus leitões a correr à nossa frente, pois tinham-se escapado do montado para o lado de fora da cerca, acompanhando-nos “em passo de corrida” quase até á barragem!

Depois do Monte Grande entramos no Vale do Pônsul, onde os trilhos se caracterizam pelo muito areão solto, aqui e ali secundado pelas pedras roliças, sempre exigente, mas também se caracteriza pela muita beleza paisagística que tem pedalar junto ao rio por quilómetros a fio… muito bonito!

Na ponte velha do Pônsul aproveitamos para vitaminar o corpinho e compor o nível de hidratação junto à fonte da Tasca da Ti Amélia, embora o nosso desejo fosse que a tasca estivesse aberta e aí sim a hidratação teria sido outra… bons tempos em que vínhamos para a “praia da mosca” do Pônsul de bicicleta pasteleira e depois bebíamos aqui uns “cai-bem” ou uns “tangos” fresquinhos!

Lentiscais ao km 110 era a “senhora” que se seguia e para lá chegar é preciso subir, sempre por estradões agora mais argilosos e arenosos, tendo sempre por companhia o muito calor, mas para nossa surpresa não chegamos a passar no centro da aldeia, virando para uma boa descida que nos leva até bem perto da Ponte dos Lentiscais, uma descida já nossa conhecida, mas… em sentido contrário! Já a passagem sobre o Pônsul é sempre bonita!

Num bom bocado em alcatrão, aproximamo-nos de Alfrívida, onde também não entramos, virando para o Santuário da Nossa Senhora dos Remédios, num bom estradão, inicialmente arenoso e depois xistoso, por entre sobreiros e eucaliptos, chegando-se pouco depois, ao km 123 a Monte Fidalgo, mais uma aldeia em fase “descendente”, pois nem vivalma, nem café por ali avistamos… valeu-nos uma providencial torneira de água junto à igreja, para arrefecermos o corpo e atestarmos novamente os níveis de hidratação… O João Valente praticamente tomou banho debaixo daquela torneira!

Esperava-nos agora uma descida seguida de uma subida que nos leva até uma paisagem privilegiada sobre a Barragem de Cedillo, visualizando-se ao longe a foz do Pônsul, à nossa frente o bonito lago criado pela barragem no Tejo e do outro lado Espanha a brilhar ao sol da tarde. Um local já nosso conhecido mas que encanta sempre!

Sensivelmente ao km 130 passamos pela aldeia dos Perais, entrando logo depois nos derradeiros km’s finais rumo a Vila Velha de Rodão, mas sem dúvida, os km’s mais desgastantes de toda a 1ª etapa. Se não bastasse o cansaço acumulado ao longo de uma centena de km’s, chegamos a este ponto do percurso e começam os trilhos típicos de V. V. Rodão - pedra… muita pedra solta, roliça, a tornar estes km’s finais num autêntico inferno para os pulsos e braços, a tal ponto de apetecer largar o guiador e deixar-nos ir… Não fosse a visão revitalizadora do Tejo e das Portas de Rodão, este bocado seria mesmo muito mau para a motivação!!

142 km’s e quase 08:30h a pedalar levaram-nos das Termas de Monfortinho a Vila Velha de Rodão, ao longo de trilhos absolutamente únicos e ímpares, alguns conhecidos, outros nem tanto, todos eles carregados de história, cultura e beleza natural que justificam a sua passagem. Visitámos 3 dos 6 concelhos que fazem parte do Geopark Naturtejo - Idanha-a-Nova, Castelo Branco, V. V. Rodão, avistando ao longe Nisa, tudo isto num só dia, tudo isto numa só assentada.

Para trás, além de um novo recorde pessoal - 142 km’s de BTT num só dia, ficava acima de tudo, a primeira de 3 etapas que nos propusemos fazer em autonomia, num ambiente de descontracção, pedalar com gosto e boa camaradagem… elementos sempre presentes do princípio ao fim, e que acabaram por marcar positivamente o dia! Era tempo de transportar as bicicletas e regressar a Castelo Branco para recarregarmos baterias! Esperava-nos em breve, outro novo dia, numa etapa não menos exigente – Vila Velha de Rodão - Proença-a-Nova.

Reportagem: Fernando Micaelo
Fotografia: João valente